Desde dezembro de 2023, o dia 20 de novembro é feriado nacional brasileiro em celebração ao Dia nacional de Zumbi e da Consciência Negra. Para além da homenagem ao líder , a data tem a finalidade de manter vivas as discussões pela igualdade racial, que nas últimas décadas teve marcos legais e institucionais importantes como:
- Estatuto da Igualdade Racial (Lei nº 12.288/2010);
- Inclusão da injúria racial como crime de racismo (Lei nº 14.532/2023);
- Criação de órgãos de promoção da igualdade racial (SEPPIR/MIR);
- Lei de Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira (Lei nº 10.639/2003);
- Cotas nas universidades (Lei nº 12.711/2012) e no Serviço Público (Lei nº 14.990/2014).
No entanto, apesar dos avanços, o país continua marcado por desigualdades raciais, o que é reflexo direto da formação histórica do povo brasileiro.
Como aponta Djamila Ribeiro, em seu Pequeno Manual Antirracista: “é importante lembrar que, apesar de a Constituição do Império de 1824 determinar que a educação era um direito de todos os cidadãos, a escola estava vetada para pessoas negras escravizadas.”
Tal veto foi essencial no processo de desumanização e marginalização da população negra, o que impactou em como as pessoas negras são vistas e percebidas dentro do imaginário social até os dias atuais. Isto implica que para um avanço das relações sociais, políticas e econômicas no Brasil, ou seja, para um avanço civilizatório, é necessário um letramento racial da sociedade como um todo.
O Racismo brasileiro é estrutural e foi construído de uma maneira única. Não há como comparar com o apartheid dos Estados Unidos ou África do Sul. A divisão racial brasileira operou em seus próprios moldes, a exemplo de leis segregacionistas como a “lei dos sexagenários”, “lei da vadiagem” e “lei do ventre livre”.
Ainda, intelectuais do século XX foram essenciais para a construção do mito da igualdade racial, ideia disseminada para defender que o Brasil já teria superado os conflitos raciais graças à miscigenação e a ausência de leis segregacionistas como em outros países.
Com este mito, a sociedade brasileira foi estimulada a não pensar as suas estruturas e tratar a desigualdade racial como um problema político, social e econômico. O que nos leva ao desafio atual – e permanente – da construção de uma sociedade com equidade racial.
No contexto jurídico, a formação de bacharéis e advogados negros aumentou nos últimos anos, mas a ocupação no mercado de trabalho ainda não é relevante. As relações no mundo jurídico são estreitas, e para além de uma boa técnica, exige-se uma boa relação interpessoal entre os profissionais. As diferenças étnicas e culturais acabam por ser barreiras efetivas para uma ausência de diversidade e manutenção de estereótipos.
No ano de 2020, com o movimento Black Lives Matter nos Estados Unidos e o avanço das discussões on-line sobre o tema, as empresas e escritórios se movimentaram para promover a inclusão racial, no entanto, a ausência de políticas robustas, revelaram um esvaziamento do tópico e, sobretudo, a ausência de profissionais negros nos quadros de funcionários das empresas e escritórios.
Para além de um desejo dos colaboradores dentro de empresas e escritórios, é necessária uma tomada de decisão dos líderes para assumir um compromisso com um ambiente com mais diversidade racial e integrado.
E para isso, é necessário não apenas o desejo de um ambiente de trabalho com mais diversidade racial, mas, primeiro, conhecer o tema e, depois, desenvolver políticas reais e efetivas para a construção deste espaço.
Com isto, este texto é um convite para um início de uma conversa que deve ser constante e contínua, para tanto, recomenda-se:
- Letramento racial: uma proposta de reconstrução da democracia brasileira, de Adilson José Moreira – professor, jurista e escritor, ganhador do Prêmio Jabuti em 2025 na categoria Educação.
- Pequeno Manual Antirracista, de Djamila Ribeiro – professora, filósofa e escritora, ganhadora do Prêmio Jabuti em 2020 na categoria Ensaios.
Referências
- OLIVEIRA, Jennifer Aline Ernesto. Interseccionalidade e Justiça Social: um olhar no campo da Filosofia do Direito. Dissertação apresentada na Faculdade de Direito da PUC-SP. Aprovada em 20.10.2023.
- FRANÇA, Michel. “Mulheres brancas são as grandes vencedoras das últimas décadas”. Folha de S. Paulo, 18.11.2025.
- IBGE. “Advocacia cresceu 39% em 12 anos, mas falta diversidade racial”. Censo 2022.
- CNN Brasil. “Mercado jurídico não absorve profissionais negros capacitados, diz especialista”.